sábado, 15 de março de 2008

O País dos Sonhos

(crônica de Alma Welt)


Eu tive em minha vida muitos privilégios, reconheço. O maior deles é o amor de meu irmão Rôdo, e sua cumplicidade, desde guris. Já me referi muitas vezes nos meus contos, crônicas, poemas e romances, à nossa convivência, nossa tramas, nossas afinidades. Se por um lado eu não tive isso com minhas irmãs mais velhas, a amizade e o amor de Rôdo superou em muito a falta de intimidades femininas, de mocinhas com quem eu pudesse compartilhar as coisas de guria.

A camaradagem com meu irmão me fazia mais aventureira, ousada, e ativa. Quando eu não estava lendo, corríamos juntos pela pradaria, pelo bosque, nadávamos pelados no poço da cascata, cavalgávamos, às vezes eu na sua frente , na mesma sela, outras lado a lado em dois cavalos. Como fomos felizes! Como tramávamos aventuras e pequenas conspirações graciosas, descobrindo o mundo... Como nos amávamos! Até hoje...

Rôdo agora não pára muito na estância, vive pelo mundo, correndo no seu carro esporte, jogando nos cassinos, perdendo, ganhando (mais ganhando que perdendo). Um profissional, na verdade.

Mas quando ele vem para curtas temporadas, aqui na estância, que ele chama o “nosso País dos Sonhos”, eu sei que é por mim, sua irmã querida, que ele volta. E somos um para o outro. Inteiros.

Amanhã ele chegará. Vou esperá-lo na porteira, e me atirarei nos seus braços por cima da porta do carro vermelho. Vou beijá-lo tanto que ele me dirá “pegajosa”, gargalhando. Depois ele prosseguirá mais um pouco, adentrando a porteira, e estacionará diante da escadaria do casarão, comigo dependurada no seu pescoço, sairá com dificuldade do carro, e subirá comigo nas costas, pulando os degraus, ágil e forte, eu de “cavalinho” escanchada em sua cintura por trás, para ir direto saudar Matilde, abraçá-la como se eu não estivesse ali empoleirada nele, numa atitude surrealista, como se eu fosse uma alucinação dos outros. Entretanto, Matilde que nos conhece, abanará a cabeça e dirá, falsamente séria:

–Guri, que bom que voltaste, não viste a Alma por aí? Ela vai grudar em ti assim que vocês se encontrarem. Como um carrapato-estrela. Tu a conheces... Bah! Aquela guria não cresce!

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