sábado, 15 de março de 2008

Divagações da Alma

(crônica de Alma Welt)


Há algo que nunca deixarei que acabe em nossa estância. Trata-se da charrete do Galdério, o hábito de irmos buscar nossos eventuais hóspedes na estaçãozinha de trem, uma das últimas Maria-Fumaça ainda na ativa no Brasil. Enquanto eu for viva lutarei pra a preservação dessa relíquia, tão cara a mim, que sou acusada de “antiquada” e passadista, por isso. O próprio Rôdo, meu querido irmão, sorri, irônico e condescendente, quando se toca no assunto. Ele, com sua paixão por carros esporte e seu amor pela velocidade, é sem dúvida bem mais “moderno” do que eu. Mas não se trata disso! É uma questão cultural, e eu tenho lutado desde a morte do Vati para que nada se modifique por aqui, e que o casarão não sofra nenhuma reforma, mesmo se mostrando nitidamente “decadente”, com rachaduras e musgo subindo pela fachada e paredes externas ( Rôdo compara-a , rindo, à Casa de Usher, de Poe). Minha luta ( reacionária talvez ) eu registrei no meu romance autobiográfico A Herança, ainda inédito. Acredito que o meu romance é atual e oportuno justamente por se situar na fronteira de dois mundos: a face tradicional e até arcaica do Pampa, e o mundo citadino, cosmopolita, da comunicação de massa, embora eu mesma não tenha comprado até hoje um celular (pasmem!). Escrevo à mão (só não com pena de ganso) antes de digitar, e somente a partir de 2001, quando fui contatada e “descoberta” pelo Guilherme de Faria, comprei um computador e aprendi a navegar na Internet. Confesso que fiquei praticamente viciada. A net é realmente a maior revolução desta virada do século, e me permite “ganhar tempo” enquanto as editoras me olham ressabiadas: “...essa escritora é profunda, tem o que dizer, na certa não venderá. As pessoas não gostam de refletir, nem de sofrer, nem mesmo de se comover, querem apenas se divertir: sua faceta ponderável para nós é a do seu erotismo. Mas ela não é suficientemente pornográfica. Será que venderá?’

Alma Welt permanece sob suspeita. Estarão os abutres esperando somente a morte da gaúcha doida, da “última romântica”? Tenho elementos para supor que sim.

Em compensação, uma rede de leitores, no boca a boca propaga minha literatura, “como musgo sobre a tundra” (expressão um tanto nórdica, minha mesma) E tenho recebido milhares de e.mails com manifestações de afeto e apreço. Isso é o que vale.


06/11/2006

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