quinta-feira, 25 de dezembro de 2014

De morrer de rir (crônica de Alma Welt)

"Quando eu era guria, correu a notícia na nossa estância, que um peão nosso de meia idade, morrera de infarto de tanto rir de alguma coisa numa roda de charla e chimarrão. Perguntei a meu pai se aquele fora um homem feliz. Meu pai respondeu: "Provavelmente não, Alma. É preciso muito desespero para se morrer de rir... " (Alma Welt)

O Livro do Segredo (crônica de Alma Welt)

 
"Quando criança, admirada com a quantidade de livros na biblioteca de meu pai, perguntei a ele se os tinha lido, todos. Ele sorriu e disse que sim. Então perguntei: Você gosta assim, tanto, de estórias? Ele riu e disse:" Alma, eu leio para ver se descubro nalgum livro, num linha que seja, a solução de um mistério: o significado da Vida". Eu insisti: "Então você ainda não descobriu? Eu vou descobrir! Por onde devo começar?" Ele parou um pouco, começou a retirar a "Bíblia Sagrada" da estante, mas voltou a recolocá-la no lugar. Então puxou "Alice no País das Maravilhas" e me deu, dizendo: "Este livro não contém soluções, como todos, somente enigmas. Mas é um bom começo. Quando você for um pouco mais velha, te darei para ler um livro que chegou muito perto da solução, este aqui... e mostrou a capa do "Os Irmãos Karamazov". Não dei mais sossego a ele, até poder ler aquele livro."

quinta-feira, 20 de março de 2014

De Herodes a Pilatos (crônica de Alma Welt)

"Um dos episódios mais curiosos do Evangelho, é que o Poncius Pilatos, representando a "justiça romana" não viu perigo nenhum em Jesus e tentou descartar-se de julgá-lo, enviando-o a Herodes, que o mandou de volta a Pilatos. Então diante da pressão dos sacerdotes do Templo, Pilatos ainda acolheu a idéia de fazer o povo escolher entre Barrabás e Cristo. Tendo o povo escolhido Barrabás, um ladrão ...(o povo sempre escolhe ladrões), lavou a mão do sangue daquele "justo". Fica claro que os romanos não viam perigo num homem que dizia sobre os impostos: "Dai a Cesar o que é de Cesar (e a Deus o que é de Deus)". Cristo não era político. Era superior demais para deter-se sobre a questão política, sempre sórdida afinal..." (Alma Welt)

O piano romântico de meu pai

"Quando muito jovem, voltando para casa depois de um passeio pela coxilha ouvi o som do piano de meu pai tocando um peça de Chopin. Um certo trecho daquela música maravilhosa me deu a súbita consciência de minha própria alma romântica. Nunca mais a reneguei, apesar da minha tendência inata à ironia, que muito tempo depois percebi ser um ingrediente não desprezado pelos melhores românticos, sobretudo os alemães, meus antepassados..." (entrevista com Alma Welt)

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

O que é a vida? (mini-crônica de Alma Welt)

"Quando guria, de uns dez anos, perguntei ao meu pai: " Vati, o que é a Vida?" Meu pai me olhou longamente com ternura e disse: "Filha, que coincidência! Também me faço essa pergunta! Vamos tentar descobrir isso cada um por seu lado, depois comparamos nossas respostas daqui a alguns anos. Combinado?" (Alma Welt)

segunda-feira, 20 de janeiro de 2014

Natureza humanizada - (mini-crônica de Alma Welt)

"Esta noite sonhei com a Natureza estranhamente humanizada. No mar da ignorância despontavam aqui e ali algumas ilhas de conhecimento. Nelas, alguns vulcões de sabedoria repousavam silenciosos. Mas o problema eram os vulcões ativos da arrogância e da prepotência. Então o sonho virou pesadelo e... acordei." (Alma Welt)

O Horizonte Vermelho - mini-crônica de Alma Welt

"Quando eu era guria, ainda em Novo Hamburgo, antes de nos mudarmos para o Pampa, para a estância, nosso quintal terminava num alto muro, que era todo o meu horizonte. Para além do muro, eu e Rodo, pequenos aventureiros, acabamos por descobrir que era o quintal de uma casa suspeita, de luz vermelha. Contei isso num pequeno conto. Mas o que quero agora lembrar é como o meu primeiro poente vermelho num horizonte distante, sem fim, mudou minha alma, como que descomprimindo-a, alargando-a. A alma... é como a água que toma a forma do vasilhame que a contém. Devo, pois, reconhecer que a Poesia já estava em mim, no meu limitado jardim que acabava no muro..." (Alma Welt)

quarta-feira, 1 de janeiro de 2014

Passagem de ano na estância (mini-crônica de Alma Welt)

"Na estância, nunca soltamos fogos na passagem de ano. Respeitamos nossos cães e os animais em geral. Ficávamos no jardim, olhando as estrelas que são os verdadeiros fogos silenciosos de Deus. Então, à meia noite em ponto o Vati (papai) punha no toca-disco, em alto volume, o coral da Ode à Alegria da Nona Sinfonia de Beethoven. Então nos abraçávamos e fazíamos um brinde com taças de champanhe. Terminada nossa cerimônia familiar bem germânica, começávamos a ouvir as gaitas dos gaúchos no seu fandango no galpão e todos corríamos para lá, encantados, para ouvir e ver os chamamés e as chulas, o desafio gaúcho. Meu coração dividido não sabia o que mais amar..." (Alma Welt)