sábado, 15 de março de 2008

Meu diário violado

Crônica de Alma Welt (1972-2007)

Eu possuí um diário quando guria, que me fora dado pela Mutti, e que tinha um cadeado de segredo, que eu considerava seguro. Era um belo livrinho de capa dura de couro, e eu gravei meu monograma nele, com pirógrafo. Em suas páginas eu comecei a exercitar o meu dom de registrar as impressões do meu dia, meus sentimentos e fantasias, que faziam parte da minha realidade, a que eu já dava tanto valor. Eu adorava a idéia de que meus registros eram secretos, e por isso eu poderia ousar tudo e passar despercebida em minha ousadia, mental e espiritual, à vigilância da minha própria mãe e de.... Solange, a inimiga.

Minha irmã mais velha, naturalmente odiou aquele objeto à primeira vista. O diário da Alma! Que coisas haveriam ali? Que ousadias, que transgressões, que pecados? Fiquei talvez mais vulnerável a ela, com a existência do meu diário. Minha mente afinal poderia ser invadida, violada. Meus segredos, meus tesouros... saqueados!

E foi o que realmente aconteceu. Solange descobriu o esconderijo do álbum, e conseguiu arrombar o cadeado. Peguei-a em flagrante lendo-o e rindo. Fiquei furiosa. Avancei para ela que correu com o livro na mão até a piscina, ameaçando jogá-lo na água. Estaria tudo perdido, o livro ficaria borrado e imprestável, e eu estaquei, estarrecida. Implorei a ela que me devolvesse meu diário. Ela então atirou-o para mim, dizendo:

–Toma aí, já conheço os teus pensamentos, e eles valem alguma coisa, principalmente para a Mutti, percebes? Agora estás nas minhas mãos. Venha beijar o meu pé, ou irei contar a ela principalmente a terceira página. Vem, ajoelha-te e beije o meu pé, escrava!

E eu, tremendo de raiva e humilhação pelo medo que realmente senti, ajoelhei-me e beijei seu pesinho gordo, que desgraçadamente lavei com minhas lágrimas.

Eu demoraria ainda muito tempo para me sentir preparada para contar tudo... ao mundo.

17/10/2006

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