(crônica de Alma Welt)
Naquele verão eu me sentia especialmente feliz e distribuía abraços e beijos aos que me cercavam. Rôdo sorria, e me observava com aqueles olhos aquilinos que eu tanto admirava. Ele se aproximou de mim, estendida na borda da piscina, beijou minha orelha (eu me arrepiei) e disse:
–Alminha, quem vem aí, hem? Quem estás esperando para esta temporada. Guri ou guria? Qual será a nova presa que compartilharás comigo, minha leoa?
Dei-lhe um soquinho pelo seu cinismo, que na verdade sempre apreciara, e sorri sem responder.
Naquela tarde eu iria à estação pra receber a minha amiga, a “açoriana” Letícia, excelente bailarina que eu reencontrara em Novo Hamburgo, e com quem já dançara algumas vezes e também pintara o retrato nu. Nua, sim, nua e linda. Rôdo admirara especialmente essa pintura, que acabei presenteando a ele.
Ao revê-la na estação eu novamente me emocionei com a sua visão, logo ao descer do trem, com sua beleza morena, sua elegância de bailarina, seu pescoço muito longo, como o meu. E abracei-a com um ligeiro aperto no coração.
Ela imediatamente perguntou:
—E aí, guria, vou afinal conhecer o teu irmão? Ele está aí, o viajante sem pouso, o inquieto trota-mundos?
Eu ri: — “Trota-mundos”? Que expressão mais antiga!... De onde tiraste, sua louquinha? Vamos lá, dá-me a tua mochila, Galdério nos espera na charrete. Vais conhecer o meu pampa no caminho.
No retorno, rumo ao casarão, eu sabia o que nos esperava. Os olhos dos dois, apenas encontrados não se despregariam mais. Eu sabia que naquela noite mesma, eu despertaria, e veria o seu lado do meu leito vazio, e certamente levantaria pra ouvir atrás das portas. Talvez entrasse, invadisse... não só por ciúmes, mas por legítimo desejo. Eu a vira primeiro.
Aquele verão prometia coisas maravilhosas, eu antevia. E me lembro que esse pensamento, ou talvez só pressentimento, estranhamente foi o que restou impregnado em meu espírito depois de tudo, de todo aquele conturbado, vago e... nada inocente verão dos meus vinte anos.
sábado, 15 de março de 2008
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