quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

A FALA DO TRONO (crônica de Alma Welt)

"Poucos anos passados da morte do Vati, eu me vi praticamente encarregada de dirigir esta estância, logo eu, a poeta, "a artista da família". Então, aconteceria por aqui uma tragédia, uma morte ocasionada por uma peleia de faca entre dois peões. A origem da desavença parecia obscura e as famílias dos dois gaúchos se tornavam inimigas e estavam se armando, novas tragédias se anunciavam, tudo levava a crer no início de uma  "vendetta"  daquelas que se perpetuam com um ódio mútuo que atravessaria gerações. Então mandei o Galdério esvaziar nosso salão retirando até mesmo a grande mesa, e convocando através do meu fiel capataz os dois gaúchos mais velhos, os patriarcas de suas famílas, me mantive sentada numa cadeira de espaldar alto para deliberadamente produzir neles a sensação de uma rainha em seu trono. Eles se aproximaram lado a lado, sem se olharem e a um gesto meu estacaram a uma distância de quatro ou cinco metros. Fiz um calculado silêncio de alguns minutos e então lhes disse solenemente:

-"Houve aqui uma tragédia. Não haverá outras. Dois jovens se perderam. Um está morto e lhe faremos as honras. O outro está preso e lhe daremos assistência. Já basta. Não haverá mais mortes e ofereceremos esta dífícil paz e conciliação ao sábio Maestro que vosmecês veneravam tanto quanto eu, sua filha. Estejam certos que ele está nos olhando. Por ele eu peço: dêem-se as mãos e esqueçam as idéias de vingança. A paciência e sabedoria de vosmecês, pais, secarão as feridas com o tempo. Não nos decepcionem..."

Fiz um gesto de rainha, que encerra a audiência. Eles se viraram um para o outro e estenderam-se hesitantemente as mãos. Era o que cabia fazer, eles sentiram.
Eu, com minha postura, não de simples patroa, mas rainha, não dera margem para outro desfecho. Eles se retiraram. Eu permaneci longamente no trono, solitária. Eu vivera o momento mais alto da minha vida. E senti que ele não excluia a Poesia..." (Alma Welt)

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