domingo, 4 de dezembro de 2011

A dádiva do Tempo (de Alma Welt)

Quando chegávamos de viagem na estação do trenzinho Maria Fumaça que servia a nossa região quando eu era guria até meus 15 anos, nosso fiel Galdério ia me buscar de charrete, e me trazia sozinha com ele enquanto nosso Vati levava os outros de carro, com as malas. Era esse o nosso acordo, permitido por meu pai, que sabia o quanto eu gostava de fruir com calma e lentamente a paisagem inigualável da coxilha. Às vezes chegávamos ao casarão com o pôr do sol, e eu, comovida, adentrava o salão já em lágrimas para cair nos braços receptivos da Matilde, nossa cozinheira, minha eterna e fiel ex-babá. Ela exclamava: "Minha guria! Como está guapa! Um pouco magra, mas vamos cuidar disso!"
Esse ritual dura até hoje, e eu sentiria falta de qualquer detalhe, como uma criança que quer que repitam a mesma estória antes de dormir, palavra por palavra, e que não falte uma sequer... Sim, às vezes me ocorre que as coisas queridas exigem fidelidade, porque elas também nos amam. Sim, as coisas nos amam... as palavras, as paisagens e o próprio Tempo! Estamos aqui por sua dádiva e ao seu seio voltaremos um dia...

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