sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

O Gaúcho Prestativo (crônica de Alma Welt)

"Quando eu era adolescente, correndo como sempre pela coxilha me afastei muito do casarão e de repente lembrei-me de que com o tempo do retorno chegaria atrazada para o almoço e seria repreendida severamente por minha mãe, talvez mesmo ficasse sem a refeição. Foi quando, providencialmente (eu pensei) apareceu do nada um gauchão, peão de nossa estância, homem de uns quarenta anos montado no seu cavalo, se oferecendo gentilmente a levar a "patroinha" de volta. Apeou, pegou-me pela cintura e instalou-me em sua sela montando a seguir atrás de mim, enlaçando com um braço minha cintura, a outra mão na rédea. O peão conduziu seu cavalo a passo, lentamente demais pra a minha quase aflição de chegar a tempo. Entretanto quando ainda estávamos à certa distância do casarão já avistado, ele apeou e deixando-me na sela continuou a pé puxando o cavalo pela rédea até encontrarmos o meu fiel Galdério em frente à nossa varanda, e que o olhava severamente. O peão tocou o chapéu com dois dedos e disse: "Compadre, encontrei a patroinha meio perdida, com o risco de se atrazar para o almoço. Está entregue a princesa. Com a licença de vosmecê, volto ao trabalho."
O Galdério nada disse, olhando fixamente nos olhos do peão, com a mão pousada na faca de prata de sua faixa.
Agora tantos anos depois desse episódio, lembrando-me das coisas que senti naquele trajeto, um certo incômodo ligeiramente excitante atrás de mim na sela, me ocorreu que a candura pode bem conviver com a inteligência. O que nunca convive com a ingenuidade é a esperteza, que essa tem bem mais afinidades com a malícia...

(Alma Welt)

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