tag:blogger.com,1999:blog-39309447078439350122024-03-04T20:37:12.506-08:00CRÔNICAS DE ALMA WELTEste espaço é destinado às crônicas curtas da grande poetisa Alma Welt, para destacá-las para os leitores que gostam de concisão, visto que muitos dos seus contos são crônicas longas, pois sendo escritora fundamentalmente confessional, quase tudo o que escreveu foi baseado em fatos vividos por ela.Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.comBlogger118125tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-29342581900199348422023-11-29T10:07:00.000-08:002023-11-29T10:07:49.863-08:00NO FIO DO BIGODE<span style="font-size: medium;">Quando eu tinha quinze anos e era portanto uma ninfeta, o Vati dando uma churrascada em nossa estância no dia de Santo Antonio, eu vestida de prenda, um guri de uns nove anos, filho de um estancieiro vizinho, vestido como um peãozinho e com um bigode de carvão sentou ao meu lado e disse, desenvolto: "Alma, eu te amo e vamos casar quando eu for grande. Mas tu tem que me esperar. Tu me espera?"<br />Eu o olhei com vontade de rir, mas só disse: "Guri, até lá eu estarei muito velha, e tu não vai mais me querer". "<br />Ele retrucou: " Vou, sim, eu gosto de gurias mais velhas..."<br />Eu olhei um pouco mais com os olhos no seu bigodinho e disse:<br />"Olhe, Martim, para esse acordo valer tu vai ter que assinar um contrato com testemunhas e tudo... Dá muito trabalho".<br />E ele:<br />"Não Alma, meu pai disse que entre gente honesta é no fio do bigode" (e ele passou a mão no lado direito do bigodinho, borrando-o).<br />Eu dei um grande suspiro e disse:<br />"Quando eu tiver trinta anos e te apresentares com a metade do bigode, a do lado esquerda, eu me casarei contigo. Não te esquece... do lado esquerdo, o do coração!"<br />E sai correndo e dando uma gargalhadinha. Na corrida dei uma ligeira olhada para trás e... vi que ele estava iluminado!<br />E... estranho... senti que me casaria mesmo com ele, se ele mantivesse aquele brilho...<br />(Alma Welt)<br />29/11/2007</span>Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-54791100481368871232022-12-28T05:57:00.002-08:002023-01-05T06:00:31.003-08:00 Reflexões de Fim de Ano (crônica de Alma Welt)<span style="font-size: medium;">Nas últimas páginas do diálogo A República, de Platão, este descreve no chamado "Mito de Er" e do "fuso de Ananke", a escolha que a alma de Odisseu morto (o inventor do "Cavalo de Tróia") faz de uma nova vida, agora de um homem modesto, comum (talvez até mesmo medíocre), já que tendo sofrido muito na sua encarnação aventurosa célebre, optou pelo contrário para sua nova encarnação e saiu dali com seu sorriso astuto de sempre... Decididamente Platão tinha humor (embora não escrachado como o de seu inimigo Aristófanes) mas tão sutil que passa despercebido até para os seus exegetas. Quanto a mim, gostaria, no jogo das almas, de renascer poeta, assim como os samurais que tivessem cumprido o Bushido (código de honra dos samurais) tinham a esperança de renascer novamente samurais após a morte em batalha, duelo, ou pelo sepuku (harakiri).<br /> Por quê, Alma? (pode alguém perguntar). Os poetas não sofrem demais, e entre os artistas não são, estatísticamente, os que mais se suicidam? Eu respondo: Sim, sofremos muito, mas também temos grandes êxtases, e descortinamos o real e seu sentido "autêntico e absoluto" (como escreveu Novalis) como ninguém...<br />"Não gostarias de renascer -insistem- como um simples dona de casa, atarefada com o asseio do lar, as roupas de cama e as de seu marido e filhos, e ser feliz armando e desarmando a árvore de Natal com um sorriso terno, pensando na alegria das crianças quando estraçalhavam os papéis coloridos que embrulhavam os presentes?" <br /> Bem... tentadores, não insistam nessas comparações, porque entre o heróico e o comezinho meu coração balança: há poesia também nas coisas mais comuns, mesmo banais, e essa é talvez a compensação do mundo. E depois... a alegria, a verdadeira alegria, sempre esteve ao alcance de todos, ainda que fugaz, e (como escreveu Nietszche) "pede eternidade, a profunda eternidade"... <br /> Alma Welt) <br /> 28/12/2022</span>Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-28032007572940014602020-07-06T14:29:00.003-07:002020-07-06T14:29:40.407-07:00O MESTRE DE VENTO (mini conto de Alma Welt)Fomos levados até o cego Zacarias que o povo dizia que era um "Mestre de Vento"... quer dizer: sabia tudo a respeito. Curiosa, depois de saudá-lo perguntei ao velho cego o que ele podia dizer do vento que estava soprando naquele momento. O velho fez um longo silêncio que repercutiu em volta, se assim posso dizer. Então falou:<br />-"O vento... o vento... Só há duas coisas: quando o vento sopra para cá todo mundo aplaude. Quando sopra para lá, todo mundo joga pedra."<br /><br /><div>
O velho disse isso e se calou. Não conseguimos tirar nada mais da sua sabedoria. Mas... talvez não precisasse.<br />.<br />06/07/2020</div>
Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-53829466708197330752020-06-13T04:49:00.000-07:002020-06-13T07:29:26.834-07:00TRATADO DO DESENCANTO CUIDADOSO <div style="background-color: white; color: #1c1e21; font-family: Helvetica, Arial, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 6px;">
Não fui uma criança triste. Nem mesmo quando adolescente a tristeza jamais me dominou. Ao contrário, fui uma criança encantada e vim me "desencantando" devagar até hoje. Faço questão de fazê-lo muito lentamente, muitas vezes tendo de lançar mão do humor para isso. Sei que há quem diga que o humor é o supremo realismo, o contrário daquela ingenuidade que se depreende do encantamento. Mas não creio nisso... o humor transfigura a realidade, muda o seu signo para nos fazer sorrir, e mesmo gargalhar. É, pois, o encantamento dos desencantados...</div>
<div style="background-color: white; color: #1c1e21; display: inline; font-family: Helvetica, Arial, sans-serif; font-size: 14px; margin-top: 6px;">
(Alma Welt)</div>
Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-468255157465921162020-05-27T03:31:00.000-07:002020-05-27T03:31:30.469-07:00A PSICANÁLISE DAS HORAS (Crônica de Alma Welt)<div style="background-color: white; color: #1c1e21; font-family: Helvetica, Arial, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 6px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; color: #1c1e21; font-family: Helvetica, Arial, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
Quando guria, eu era um tanto precoce, e o Vati (papai) perguntou-me o que eu queria ser quando crescesse. Como ele era médico, cirurgião, um cientista (e eu não gostava de carnificina), querendo agradá-lo, de pronto respondi:</div>
<div style="background-color: white; color: #1c1e21; font-family: Helvetica, Arial, sans-serif; font-size: 14px; margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
-"Uma cientista!"</div>
<div class="text_exposed_show" style="background-color: white; color: #1c1e21; display: inline; font-family: Helvetica, Arial, sans-serif; font-size: 14px;">
<div style="font-family: inherit; margin-bottom: 6px;">
Meu pai sorriu e então disse:<br />
-"Se queres ser cientista, comece assim desde já: toma um objeto para estudo, qualquer que seja a tua escolha e dedica-te a observá-lo sob todos os ângulos possíveis, seus desdobramentos e funções, ordem, espécie, família, etç.<br />
Aprofunda-te nele o quanto puderes e depois venha me mostrar suas conclusões."</div>
<div style="font-family: inherit; margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
Suponho que meu pai, pelos meus gostos mais evidentes, imaginou que eu escolheria uma flor para meus estudos... Passados alguns dias ele me interpelou:</div>
<div style="font-family: inherit; margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
- "Então, Alma, o que escolheste estudar e quais as tuas conclusões?"</div>
<div style="font-family: inherit; margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
- "Estudei a psicologia das Horas, Vati" - respondi- "Observei-as longamente. Elas são tímidas filhas do Tempo, passam ligeiras se tu não as observa, mas se o fazes pelo relógio, que é para elas um incômodo microscópio, elas se põe envergonhadas, hesitantes, morosas, e disfarçam, custam muito a passar. São dúbias, também... e traiçoeiras, trazem surpresas se te esqueces um pouco delas. Além disso guardam ressentimento e acho que podem ser mortais quando se sentem desperdiçadas..."</div>
<div style="font-family: inherit; margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
Meu pai, percebendo a minha marotice, piscou um olho, sorriu, e disse:</div>
<div style="font-family: inherit; margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
- "Filha, não, não és uma cientista, nem sequer uma psicóloga. ÉS POETA. Vai, vai brincar, que é o que os poetas fazem a sério... e com muito proveito para todos nós."</div>
<div style="font-family: inherit; margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
(Alma Welt)</div>
</div>
Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-7262749033316906272018-05-05T15:54:00.004-07:002018-05-05T15:54:35.882-07:00Dos pecados prediletos (crônica de Alma Welt)<span style="background-color: white; color: #1d2129; font-family: Helvetica, Arial, sans-serif; font-size: 14px;">Cada povo tem as sua peculiaridades, frequentemente ligadas aos seus pecados prediletos. Quando eu viajava pelo Brasil para conhecer o povo além dos limites do meu pampa, uma vez em Minas Gerais, numa pequena cidade, fui levada a conhecer a moradora mais idosa, uma senhora Dona Sinhá, que estava com 106 anos. Em sua casa, depois de a saudarmos muito, ela em sua cadeira de balanço, uma pessoa que me acompanhava perguntou-lhe a meu pedido: "Dona Sinhá, o que a senhora faz para ter tanta saúde e viver assim tão bem, há tanto tempo?" E a velha senhora respondeu: Ah! Minha filha... faço nada não, é só preguiça. Tenho muita preguiça de morrer... e vou vivendo." (Alma Welt)</span>Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-344712899713534662016-11-15T09:07:00.003-08:002016-11-15T09:07:38.940-08:00O marido de minha amiga ( crônica de Alma Welt)<span style="background-color: white; color: #1d2129; font-family: Helvetica, Arial, sans-serif; font-size: 13.63636302947998px; line-height: 17.563634872436523px;">"Uma amiga minha tinha um marido que alguns achavam mesquinho e invejoso, e não viam nele grandes qualidades, apenas a obrigatória honestidade de um pai de família. Entretanto esse homem, desenvolvendo um câncer, hospitalizado, com metástase, desenganado, demonstrou uma das maiores coragens e dignidade que já vi em alguém: não se queixou nem um pouco, em nenhum momento, e seu último desejo foi uma média com pão e manteiga na chapa. E morreu sem um suspiro, como um cordeiro." (Alma Welt)</span>Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-82366301110492402122016-10-04T17:10:00.002-07:002016-10-06T07:21:30.649-07:00O rapaz do livro ( crônica de Alma Welt)<div style="background-color: white; color: #1d2129; font-family: helvetica, arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.31999969482422px; margin-bottom: 6px;">
Um dia, quando eu era ainda guria, meu pai recebeu uma misteriosa visita, um jovem bem vestido e com um livro na mão. Meu pai, o levou imediatamente ao seu escritório, onde ficava (e ainda fica) sua imensa biblioteca. Meu pai trancou a porta, não deixando que eu presenciasse a conversa. Eu, muito curiosa, cheguei a colar o ouvido na porta, mas não pude distinguir as palavras. Afinal quando a porta se abriu, o rapaz saiu com o livro,<span class="text_exposed_show" style="display: inline;"> parou na minha frente, me olhou, e disse: "Então, tu és a Alma?" - "Sim - eu disse- E tu quem és?" O rapaz demorou uns segundos e respondeu em voz baixa: "Sou teu irmão, mas infelizmente não nos veremos mais." Tocou-me o queixo levemente com a ponta dos dedos, virou as costas e saiu para montar seu cavalo e partir. Fiquei atônita e depois pensativa por alguns dias. Então, um dia perguntei ao meu pai: "É verdade, Vati, que aquele moço era meu... irmão? E meu pai contra-arguiu: "Como? Ele te disse isso?" Não, filha, não pode ser... Ele a mim disse ser um parente distante e que quis me conhecer pelo livro que escrevi, que apreciou e veio pedir o meu autógrafo. Agora você me deixou intrigado..." Quanto a mim, resolvi naquele instante que um dia resolveria aquele mistério, porque eu sabia que meu pai podia ignorar algo, mas jamais mentir...</span></div>
<div style="background-color: white; color: #1d2129; font-family: helvetica, arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.31999969482422px; margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
Aos meus dezesseis anos minha mãe morreu, e depois de um período de sofrimento e remorsos, me senti livre para ir, de alguma forma em busca de meu meio-irmão perdido, de que me dei conta de que nem sequer sabia o nome. Mas perguntando ao meu pai ele se lembrou pois fizera uma dedicatória a ele no livro, o que o ajudou a lembrar: Bruno, e com alguma dificuldade o sobrenome, Álvares, certamente de sua mãe. Eu me lembra<span class="text_exposed_show" style="display: inline;">va de seu belo rosto, e na verdade, isso me atraíra e agora mais me motivava. Precisei de um ano e meio de pesquisas, começando por interrogar meu pai quanto ao seu passado, o que não chegou a ser constrangedor, devido à grande abertura que ele tinha comigo, pela nossa imensa afinidade. Então, um dia, já com dezoito anos, pude fazer uma viagem a Porto Alegre para encontrar o irmão que eu já sentia amar. Cheia de emoção, toquei afinal a campainha de um predinho de seis andares e ouvi uma voz feminina perguntando quem era. " Sou Alma", respondi, "quero falar com o Bruno". A porta se abriu com um zumbido, entrei e subi quatro andares pela escada. Ao chegar, a porta estava aberta e uma bela moça com um bebê no colo me recebeu com lágrimas nos olhos. Estendeu-me a mão e me abraçou com o bebê e tudo, soluçando. Eu tinha chegado tarde demais...</span><br />
Letícia, era o seu nome, e depois do comovido abraço me fez entrar e sentar-me num modesto sofá. O bebê começou a chorar e ela o balançava e andava um pouco de um lado para o outro. Quando o bebê se acalmou ela o levou para o quarto, o colocou no berço e passado uns minutos voltou e sentou-se numa poltrona à minha frente. "Pois é, Alma... Bruno se foi..." E caiu em prantos novamente! Atônita eu perguntei: "Mas o qu<span class="text_exposed_show" style="display: inline;">e foi que aconteceu?". Letícia enxugou os olhos com as palmas das mãos, e disse: "Pra mim, é como se tivesse morrido... " Confesso que suspirei aliviada, Bruno estava vivo! Eu precisava saber o que estava acontecendo... aliás eu precisava saber tudo, desde o começo, pois na verdade eu não sabia nada. Não sabia de sua mãe e dele depois da aventura que meu pai acabou me contando alguns meses antes.O Vati me confessou que quando jovem tivera uma fase de boemia em Buenos Ayres e sendo um amante de ópera e frequentando o Teatro Colón acabara conhecendo uma soprano de coro, muito bela e tivera um caso fugaz com a moça. Quando o caso acabou, depois de alguns meses, por infidelidade de ambos, meu futuro pai voltou para o Vale do Itajaí onde se casou com minha mãe, Ana Morgado, da colônia açoriana, sua namorada de adolescência, e se aquietando, resolvido a ser fiel para o resto de sua vida. Muita água correu até meu pai mudar-se com minha mãe em final de gravidez para Novo Hamburgo, numa viagem de carro onde nasci na relva do acostamento, num parto natural em que meu pai foi o parteiro, cortando o cordão com um canivete suíço desinfetado com Steinhegger, numa despedida de meu pai a essa bebida, que ao que parece, o desviara bastante na juventude. Ele nada mais soube de sua breve amante, e minha mãe nunca soube dessa aventura de meu pai. Para ela a fase de Buenos Ayres era como uma um pouco longa despedida de solteiro de seu noivo. Mas... voltando àquele momento, eu precisava saber o que acontecera, já que meu irmão, ao que parecia, estava vivo e desaparecido...</span><span class="text_exposed_show" style="display: inline;"></span><br />
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Finalmente, Letícia se dispôs a contar o que acontecera com Bruno. Ela disse: "Estávamos vivendo bastante mal desde que o bebê nasceu. Faltava dinheiro, Bruno não ganhava o suficiente com seus escritos para um jornaleco, vivia insatisfeito, frustado, e brigávamos a todo momento. Foi então que apareceu aqui um rapaz que disse ser seu meio-irmão, um aventureiro cheio de charme e sedução, vivia do jogo de poker e viajava pelo mundo,<span class="text_exposed_show" style="display: inline;"> de cassino em cassino e dizia ganhar fortunas.Exibia grandes rolos de notas." (Tive um arrepio! A descrição batia com o perfil de Rodo, meu irmão...) "Como se chamava esse guri?"- perguntei ansiosa. "Rudolph", ela disse. "Bruno estava hipnotizado e resolveu partir com ele, à aventura, para fazer fortuna com o poker, veja só... Seu desespero se juntara ao fascínio daquele demônio, que prometia ensinar todos os truques que lhe trariam fortuna e também o glamour de uma vida tão diferente deste pequeno apartamento e do nosso cotidiano. Não consegui convencê-lo de que aquilo tudo era um sonho. A Ferrari vermelha estacionada lá em baixo, à nossa porta, superava os meus argumentos. E ele, um dia se foi. Eles se foram juntos, e já faz um mês que não tenho notícias de Bruno. O tentador o levou... "</span></div>
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<span class="text_exposed_show" style="display: inline;">Eu estava estarrecida, Rudolph é o verdadeiro nome de Rodo, meu irmão, que cresceu junto comigo. Praticamente só eu o chamo assim desde crianças. Sua natureza de aventureiro e jogador só não foi considerada irresponsável pela família devido ao seu sucesso como jogador excepcional, mestre do blefe. Sim, por ser bem sucedido, isto é, ganhar muito dinheiro . Mas também devo dizer, por ter uma boa índole e um grande coração. E Isto eu podia testemunhar. Nada estava perdido. Não fora o demônio, fora um anjo destemido e aventureiro! Os irmãos estavam juntos! Eu ofegava, de alívio e alegria. Gritei de repente: "Letícia, nada temas! Teu Bruno voltará, com muito dinheiro! Eu sei, eu sei!" enquanto a abraçava, loucamente..."</span></div>
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Letícia, espantadíssima, por um momento me repeliu, pensando estar diante de uma louca. Mas eu disse: "Letícia, minha irmã... Posso chamá-la assim? Rudolph é o meu irmão Rodo, e ponho minha mão no fogo por ele. Os irmãos estão juntos! É tudo verdade, o ciclo se fecha! Deus é grande! Vê: O sangue se atrai, as almas também! Eles tinham que se encontrar. Rodo sempre esteve um passo à frente de mim, no fluxo da vida. Eu fui sempre <span class="text_exposed_show" style="display: inline;">a retaguarda, a testemunha, escrevendo, escrevendo. Eu mesma fui com Rodo por algum tempo pelos cassinos, em aventuras, perigosas às vezes, confesso. Mas ele me protegia como um anjo, e voltei sã e salva. Não era a minha verdadeira natureza, e renunciei a essa vida de aventuras. Mas se Bruno é um escritor, também renunciará, voltará. Não temos a natureza de pessoas de ação. O importante é que Rodo o protegerá daqui por diante, e a ti e ao teu bebê também. Eu garanto. Eu mesma quero protegê-los também, como meus novos irmãos. Aceitas? " </span></div>
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Leticia, relutantemente, gradativamente, se deixou abraçar. E juntas fomos olhar o bebê, que dormia lindamente no berço...</div>
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FIM</div>
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</div>
Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-44538312508517731902016-09-17T09:09:00.002-07:002017-11-12T08:44:26.050-08:00A hospedeira mineira (crônica de Alma Welt)<span style="background-color: white; color: #1d2129; font-family: "helvetica" , "arial" , sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.31999969482422px;">Minha hospedeira mineira me falou assim no café da manhã: "'De madrugada, acordei sem sabê porquê, tive uma insônha, o galo cantava, o cachorro latiu, levantei fui até a cozinha. Tinha umas brasa no fogão, acendi um pito, tinha um poco de café frio no bule dei uma requentada, botei na caneca e fiquei ali na porta aberta da cozinha olhando o terreiro escuro, nevoado, fiquei ali assuntando, assuntando, a névoa foi baixando, as estrelas aparecero e umas nuvens; sapos cantando, grilos cricrilando, as galinhas ciscando... Vai chuver, não vai chuver...Tava loca procê acordar pr'eu falar dotros assunto!... (Alma Welt)</span>Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-31009021384924258462016-09-17T09:07:00.004-07:002016-09-17T09:07:50.354-07:00Egotista Sublime (crônica de Alma Welt)<span style="background-color: white; color: #1d2129; font-family: helvetica, arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.31999969482422px;">"Escrever é a suprema afirmação do eu... do ego, se quiserem. Por isso quase todo mundo escreve, inclusive alguns analfabetos. Entretanto, paradoxalmente, os melhores livros são os que escondem o ego do autor e dão vida a personagens totalmente diferentes dele mesmo. Sou insuspeita para dizer isso pois sou uma escritora confessional, sempre na primeira pessoa, falando sempre de mim. O que me justifica? Descobri com o famoso crítico inglês Herbert Reed (já falecido) que pertenço a um tipo de poeta classificado por ele como " o egotista sublime" , isto é, parto de mim mesma para atingir uma universalidade. "Fale com profundidade e graça de sua aldeia e conquistarás o mundo inteiro". Fale de si com absoluta sinceridade e desnudamento, e atingirás o universal..." (entrevista com Alma Welt)</span>Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-42363349856410564572016-08-24T11:05:00.001-07:002016-08-24T11:10:22.133-07:00Os segredos da biblioteca de meu pai<span style="background-color: white; color: #1d2129; font-family: "helvetica" , "arial" , sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.31999969482422px;">"Ainda quando criança, eu costumava entrar na biblioteca de meu pai, escondida, quando ele não estava em casa, para olhar as lombadas dos livros e descobrir alguma coisa espantosa, uma espécie de segredo camuflado. Bem... quase tudo o era. Eu retirava aleatoriamente ou pelo titulo sugestivo, somente um deles da estante, de cada vez, e o folheava a esmo lendo algum parágrafo. Era como olhar por uma fresta, o mundo se abria. Eu iria ler tudo, eu me prometia. E eu iria escrever também, porque não poderia haver nada mais secreto. E os segredos, me parecia, eram feitos para serem descobertos por pessoas como eu, que prometia passá-los adiante sem traí-los..." (Alma Welt)</span>Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-83977202884641212012016-08-12T07:51:00.002-07:002016-08-12T07:51:27.905-07:00Pensando a vida (Crônica de Alma Welt)<div style="background-color: white; color: #1d2129; font-family: helvetica, arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.31999969482422px; margin-bottom: 6px;">
"Penso muito na vida e no mundo de uma maneira geral, não pessoal, isto é, com um distanciamento senão crítico, de espectadora. Me parece sempre que estou do lado de fora, e que a minha vida mesma pertence a uma outra esfera, mais monótona, bucólica e de uma solidão romântica às vezes dolorosa. Não sei porque sou assim, pois, afinal, tendo duas irmã mais pragmáticas e um irmão ousado e aventureiro, não deveria me sentir assim, fora do mu<span class="text_exposed_show" style="display: inline;">ndo verdadeiro, como se vivesse num sonho plausível, ligeiramente melancólico. Rodo, meu irmão, muitas vezes me arrastou para aventuras, na nossa infância, em que eu não me entregava totalmente, talvez por causa da minha admiração por ele, por seu entusiasmo e simplicidade. Minha natureza de poeta e escritora sempre foi contemplativa, e me impede de me integrar com o ambiente humano ao meu redor. Serei uma romântica como George Sand como escritora? Estarei vendo este Pampa e estes peões que me circundam, "os gáltchos" e gaudérios, de maneira idealista, ou mesmo folclórica? Não sei... O mundo vai julgar. Sei que sou sincera e derramo as palavras como elas me vêm, embora cultivadas e não rudes como esses simpáticos machões que me circundam, com suas falas altas e sonoras, com sua bombachas, bigodes e chimarrões. E até com seus sinistros punhais adormecidos nas faixas que envolvem suas cinturas..." (Alma Welt)</span></div>
Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-84680579570434397282016-08-12T07:49:00.001-07:002016-08-12T07:49:41.256-07:00Minha vida dentro da Alma (crônica de Alma Welt)<div style="background-color: white; color: #1d2129; font-family: helvetica, arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.31999969482422px; margin-bottom: 6px;">
"Quando guria eu pensava no Mundo como algo que só existia muito longe de casa e do qual eu ficava sabendo pelos livros, isto é, pelos romances. E o mundo era muito grande, variado, e abarcava todas as épocas ao mesmo tempo. Isso, como sensação, me acompanhou a vida toda, pois me sinto sempre preenchida de todos os séculos, simultaneamente, desde a era dos egípcios, gregos e romanos. Báh! Dos Judeus também... Gosto muito de Adã<span class="text_exposed_show" style="display: inline;">o e Eva, que me comoveram bastante. Eu os teria acolhido, expulsos que foram injustamente por uma besteirinha do roubo de uma fruta, assim pensava eu... Mas eu gostava mesmo era do Odisseu, com cujo espírito aventureiro eu me identificava ao mesmo tempo que com a Penélope que ficava em casa fiando e esperando. Me parecia ser um e outro "simultaneamente", embora eu não conhecesse essa palavra. Muito mais tarde vim a compreender que esse era o meu dom e maldição, que me fazia viver de verdade, quero dizer, intensamente, somente através da Arte, como se num arremedo da vida, num palco de minha própria alma..." ( Alma Welt)</span></div>
Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-32422720910768443562016-08-12T07:48:00.000-07:002016-08-12T07:48:01.453-07:00A Espera (crônica de Alma Welt)<div style="background-color: white; color: #1d2129; font-family: helvetica, arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.31999969482422px; margin-bottom: 6px;">
"Quando criança perguntei ao meu pai: "Vati, o que é Esperança? Eu vi essa palavra num livro, mas acho que não entendi bem o que ela é... " Meu pai parou um pouco o que fazia, me olhou e disse, ternamente como sempre: "Alma, a Esperança é um sinal de que a gente não está feliz..A gente só sente esperança quando as coisas não vão nada bem e estamos esperando alguma mudança. Não é o teu caso... É, filha?" Eu pensei um pouco e acho que menti: "Não, Vati, só me lembro de esperar o Natal quando ele está perto. Mas é para ficar mais alegre ainda." Meu pai me olhou lindamente e passando a mão no meu rosto, ficou embargado, eu vi nos seus olhos..." (Alma Welt)</div>
Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-10355835463334410582015-07-03T04:24:00.002-07:002015-07-03T04:24:57.427-07:00Encontro na coxilha (crônica de Alma Welt)<div style="background-color: white; color: #141823; font-family: helvetica, arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.31999969482422px; margin-bottom: 6px;">
"Uma vez, aos dezesseis, caminhando pela coxilha, um peão gaúcho me alcançou e me segurou forte os dois braços. Encarei-o com tanta intensidade hostil que ele me soltou, virou-se e foi embora. Permaneci extática e esperei ele estar longe, para então desmaiar. Fui encontrada pelo fiel Galdério que me trouxe nos braços desfalecida. Cabeças deveriam rolar, por assim dizer, mas o peão era um estranho, um forasteiro, não foi encontrado. Quanto a mim, tal esforço me custou três <span class="text_exposed_show" style="display: inline;">dias de cama. Difícil foi convencer a Mutti de que eu não fora estuprada, e restabelecida, me convenci de ser muito forte. Continuo passeando na coxilha até hoje, e nadando sozinha no "poço da cascata" como quando criança, com Rodo, confiante de que um raio "não cai duas vezes..." ( Alma Welt)<br />________________________________</span></div>
<div class="text_exposed_show" style="background-color: white; color: #141823; display: inline; font-family: helvetica, arial, sans-serif; line-height: 19.31999969482422px;">
<div style="margin-bottom: 6px;">
<span style="font-size: x-small;"><i>Nota<br />Em 20 de Janeiro de 2007, a grande poetisa Alma foi encontrada morta, afogada, no poço da cascata, nua, com uma corda no pescoço ancorada a uma grande pedra. Estava no auge de sua beleza e talento. Até hoje existe dúvida se foi assassinato ou suicídio. Um grande mistério, por não haver no corpo sinais de estupro. A marca vermelha no pescoço, atribuída à corda e os arranhões na parte interna dos antebraços foram creditados pelos técnicos da policia ao escorregar da pedra ao ser largada, e não a uma desesperada luta. O velório nu da Alma sobre a mesa da sala do casarão, constituiu-se uma das coisas mais espantosas e inacreditáveis acontecidas no Rio Grande do Sul, mas atualmente é considerada um Mito, como de resto, a própria passagem da poetisa por este mundo. (Guilherme de Faria)</i></span></div>
<div style="margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
<span style="font-size: x-small;"><b>Visão (de Alma Welt)</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
<span style="font-size: x-small;"><b>Ser a musa eternizada do meu pampa!<br />Cantar, celebrar e endoidecer<br />De tanto amar até saltar a tampa<br />Do coração e da mente, e então morrer!</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
<span style="font-size: x-small;"><b>Nua, estranhamente, sobre a mesa<br />Estendida me vejo, uma manhã:<br />Um desfile silencioso me corteja<br />De peões, peonas e algum fã.</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
<span style="font-size: x-small;"><b>Mas olho o meu corpo de alabastro,<br />Absurdo e belo ali, e não à toa<br />Eu noto algo nele que destoa:</b></span></div>
<div style="margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
<b><span style="font-size: x-small;">Sobre a alvura do pescoço bailarino<br />Uma faixa vermelha como um rastro<br />Da corda que selou o meu destino..</span><span style="font-size: 14px;">.</span></b></div>
</div>
Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-79661853964588728522015-06-18T06:37:00.003-07:002015-06-18T06:37:54.924-07:00A morte de um gaúcho (crônica de Alma Welt)<div style="background-color: white; color: #141823; font-family: helvetica, arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.31999969482422px; margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
"Um manhã, quando eu era guria, vagando como de costume pela coxilha não muito longe do casarão, vi ao longe um cavalo selado, de cabeça baixa sem o seu cavaleiro. Intrigada, andei até lá e deparei com o corpo caído de um gaúcho . Ele estava morto, ostentando uma ferida no peito. Fiquei uns minutos ali, mais curiosa que perplexa, e então voltei ao casarão para avisar meu pai. De noite percebi minha mãe, a Açoriana, andando no corredor e abrindo levemente a porta do meu quarto para me observar. Eu estava insone, mas não, eu não tinha medo, mas uma curiosidade imensa de desvendar aquele enredo, assistindo àquele duelo e seus desdobramentos em minha mente..." ( Alma Welt)</div>
Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-19597170982177557832015-06-11T17:55:00.003-07:002015-06-11T17:55:54.732-07:00O tamanho do mundo (crônica de Alma Welt)<div style="background-color: white; color: #141823; font-family: helvetica, arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.31999969482422px; margin-bottom: 6px;">
"Uma vez, quando ainda era uma guriazinha fugi de casa, de manhã, para "conhecer o mundo". Atravessei o portão do jardim, depois a porteira e fui andando pela estrada da coxilha. Andei e andei, tanto que fiquei exausta e com fome. Sentei na beira da estrada e chorei de decepção do mundo e vergonha de mim mesma. Até que chegou o Galdério, de charrete, e me tirou daquela enrascada, dizendo com naturalidade: "Alma, vim só lembrar-te que está na hora do almoço. Vou voltar já. Q<span class="text_exposed_show" style="display: inline;">ueres uma carona?"<br />Meu fiel charreteiro era realmente sutil..." (Alma Welt)<br />.............................................................</span></div>
<div class="text_exposed_show" style="background-color: white; color: #141823; display: inline; font-family: helvetica, arial, sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.31999969482422px;">
<div style="margin-bottom: 6px;">
O tamanho do mundo (de Alma Welt)</div>
<div style="margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
Guria andei sozinha numa estrada<br />Aqui mesmo na estância, para ver<br />Aonde ela ia dar, e desastrada<br />Não cogitei da confusão que ia fazer.</div>
<div style="margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
Andei por uma hora e não acabava,<br />E já passava da hora de almoçar.<br />Pensei: mais uma hora pra voltar...<br />E sentando à margem mais chorava.</div>
<div style="margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
Então vi o Galdério na charrete<br />Que a mando do meu pai me procurava<br />E conhecia muito bem esta pivete</div>
<div style="margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
E levantando e enxugando o ranho<br />Eu disse: "Ah! Galdério, eu não contava<br />Com que o mundo tivesse esse tamanho..."</div>
</div>
Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-26638291621599430382015-06-01T07:40:00.004-07:002015-06-01T07:40:55.967-07:00Meu pequeno vigilante (crônica de Alma Welt)<div style="background-color: white; color: #141823; font-family: helvetica, arial, 'lucida grande', sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.31999969482422px; margin-bottom: 6px;">
<br /></div>
<div style="background-color: white; color: #141823; font-family: helvetica, arial, 'lucida grande', sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.31999969482422px; margin-bottom: 6px; margin-top: 6px;">
"Tenho o hábito de acordar bem cedo e vagar pela coxilha que cintila lindamente em reflexos prateados seu orvalho da madrugada. Numa manhã dessas topei com um negrinho aqui da estância que me fazia pensar no Negrinho nosso do Pastoreio, embora nunca esteja pastoreando nenhuma rês. Ele disse logo: "Bom dia Dona Alma. Eu vejo a senhora de manhã todos os dias, mas me escondo atrás dos cupins por isso a senhora não me vê. Hoje tomei <span class="text_exposed_show" style="display: inline;">coragem e não me escondi." Surpresa, eu disse sorrindo: "Bom dia, Raimundinho! Mas que negócio é esse de me observar escondido? Não sabes que isso é feio?" Então ele sorriu meio envergonhado e respondeu: "Ah! Dona Alma... É que assim eu penso que estou protegendo a senhora, porque de perto e de frente é como se a senhora é que estivesse me protegendo, e não é certo." Fiquei olhando pra ele, comovida de ver que ele se conhecia tanto, capaz de expressar uma coisa como essa, que resumia toda a sua dignidade e fidelidade, com as quais eu poderia sempre contar..." (Alma Welt)</span></div>
Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-33461242602188209772015-05-24T18:03:00.004-07:002015-05-24T18:03:33.312-07:00Um segredo de meu pai (crônica de Alma Welt)<div style="background-color: white; color: #141823; font-family: helvetica, arial, 'lucida grande', sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.31999969482422px; margin-bottom: 6px;">
"Após a morte de meu Vati, fugi da estância, exilei-me muito longe, na cidade de São Paulo por quatro longos anos. No retorno passei a investigar no casarão, mais precisamente na biblioteca e escritório, as pegadas de meu pai, sua vida secreta de que eu suspeitava, seus segredos... Descobri na sua correspondência uma carta dele a um amigo, que revelava que ele tinha pelo menos uma outra filha de uma relação antiga, a qual ele nunc<span class="text_exposed_show" style="display: inline;">a mencionou e que foi criada longe de nós pela mãe. Depois do choque tratei de por-me em campo para encontrar essa minha irmã. A primeira pessoa que interroguei foi, naturalmente, a nossa fiel Matilde, uruguaia de origem e nossa cozinheira, antiga na família e que fora minha babá. Matilde então disse: "Alma, esperei pacientemente este dia, porque prometi ao teu pai manter segredo durante sua vida, e que só revelaria a ti se fosse interpelada a esse respeito. Tua irmã é filha de uma cigana com quem teu pai viveu uma tumultuada paixão quando jovem. Não estranhavas que teu pai deixasse que os ciganos acampassem reiteradas vezes aqui na estância, para indignação dos estancieiros vizinhos, sempre ali junto do bosque? Tu os visitava desde guria, provavelmente conheceste tua irmã sem saber..." Arrepiei-me toda... Rafisa! Minha estranha atração por aquela bela e enigmática cigana! Nossa mútua fascinação, nossa inefável química... nosso amor! Só podia ser ela! Entretanto, nômade que era, minha irmã estava sumida no mundo." (Alma Welt)</span></div>
Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-10152928936070824112015-05-17T07:47:00.003-07:002015-05-17T07:47:32.959-07:00Códigos (crônica de Alma Welt)<span style="background-color: white; color: #141823; font-family: helvetica, arial, 'lucida grande', sans-serif; font-size: 14px; line-height: 19.31999969482422px;">"Um peão gaúcho, desconhecido, aproximou-se de mim a cavalo na coxilha, diante da nossa porteira, tirou o chapéu e disse querendo ser galante: "Buenas, prenda, quem é o peão macho que dá ordens por aqui? Já vi beleza, mas não vi uma bombacha até agora..." Olhei-o nos olhos e respondi: "Buenas, senhor, mas aqui os machos são servidores. Dê a volta por trás e fale com o meu capataz se quiseres emprego. Ele "le" reenviará a mim depois de uma primeira avaliação de macho para macho". O gaúcho sorriu, colocou o chapéu, o tocou, afastou-se e fez a volta em direção ao curral onde estaria o nosso Galdério. De longe observei-lhes a postura tensa e seu nada sutil código corporal de "machos". Dei um suspiro e continuei a colher flores." (Alma Welt)</span>Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-41426005172570285102015-03-29T15:03:00.000-07:002015-03-29T15:05:06.563-07:00O Ponto Mais Alto (crônica de Alma Welt)<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; background-color: white; color: #141823; display: block; font-size-adjust: none; font-stretch: normal; font: 14px/19.31px helvetica, arial, "lucida grande", sans-serif; letter-spacing: normal; margin: 0px 0px 6px; text-align: left; text-indent: 0px; text-transform: none; white-space: normal; word-spacing: 0px;">
<br />
"Uma vez, numa mesa de amigos num café em Porto Alegre, um de nós, que não eu, disse: "Perdoem os pintores, cineastas, músicos e etc, mas o Poeta é o mais alto da humanidade". Outro logo retrucou: "Não, estás totalmente enganado: o Santo é o mais alto". Começou uma acalorada discussão razoavelmente erudita entre aqueles dotados amigos, enquanto eu permanecia quieta, perplexa... "E tu, Alma? O que achas? Qual o ponto mais alto?<span class="text_exposed_show" style="display: inline;">" Respondi então: "A mãe. O coração maternal." Foi como água na fervura. Não esperavam algo assim, logo de mim que nunca me entendi bem com minha mãe e idolatro meu pai, como eles sabiam. Então um deles segurou minha mão carinhosamente, e virando-se para os outros levantou o copo e disse: "Vamos brindar a este momento, e à amizade que é o ponto mais próximo que, por ora, podemos chegar de um tal coração!"<br />Uma gargalhada geral distendeu os intelectos, e talvez também os corações..."<br />(Alma Welt)</span></div>
Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-21656720691634615322015-02-09T05:12:00.002-08:002015-02-09T05:14:08.894-08:00O reino feliz de meu pai (crônica de Alma Welt)<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; background-color: white; color: #141823; display: block; font-size-adjust: none; font-stretch: normal; font: 14px/19.31px Helvetica, Arial, "lucida grande", tahoma, verdana, arial, sans-serif; letter-spacing: normal; margin: 0px 0px 6px; text-align: left; text-indent: 0px; text-transform: none; white-space: normal; word-spacing: 0px;">
</div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; background-color: white; color: #141823; display: block; font-size-adjust: none; font-stretch: normal; font: 14px/19.31px Helvetica, Arial, "lucida grande", tahoma, verdana, arial, sans-serif; letter-spacing: normal; margin: 6px 0px; text-align: left; text-indent: 0px; text-transform: none; white-space: normal; word-spacing: 0px;">
Quando eu era guria, havia uma vizinha estancieira velha que explorava os seus empregados. Falecidos os meus avós, meu pai passou a pagar melhores salários aos nossos "gáltchos", acima dos praticados nas estâncias vizinhas, o que provocou uma corrida ao nosso casarão. Alguns peões abandonavam seus velhos patrões ou vinham escondidos sondar a possibilidade de novo emprego com meu pai, que frequentemente os dissuadia, por não dar<span class="Apple-converted-space"> </span><span class="text_exposed_show" style="display: inline;">conta de absorvê-los. Então, aquela velha estancieira montada a cavalo veio até diante de nossa varanda, ataviada como um gáltcho, de bombacha, botas, esporas e faixa com punhal de prata na cintura, chapéu de barbicacho, aba dobrada na testa. Sem apear-se, com um relho na mão (a outra na cintura) apontou-o para o meu pai ( este imponente, nunca me esquecerei, de pé na varanda) e disse-lhe alto:</span></div>
<div class="text_exposed_show" style="-webkit-text-stroke-width: 0px; background-color: white; color: #141823; display: inline; font-size-adjust: none; font-stretch: normal; font: 14px/19.31px Helvetica, Arial, "lucida grande", tahoma, verdana, arial, sans-serif; letter-spacing: normal; text-align: left; text-indent: 0px; text-transform: none; white-space: normal; word-spacing: 0px;">
<div style="margin: 0px 0px 6px;">
-"Senhor "boche", o senhor está inflacionando os salários e roubando-nos nossos empregados. Isso é contra a lei, pare com isso ou vou à polícia, vou ao governo do Estado se preciso. O senhor está avisado!"</div>
<div style="margin: 6px 0px;">
Olhei para o meu pai, esperando sua resposta, mas ele, impassível, nada disse. Para meu espanto tocou apenas o chapéu como um cumprimento e ficou vendo a velha se afastar arrogantemente. Eu era pequena e apesar de minha curiosidade, nunca soube o que aconteceu depois, já que meu pai não perdeu nem uma noite de sono, isso eu percebi. Como contornou ele a delicada a situação?</div>
<div style="margin: 6px 0px;">
Muitos anos mais tarde perguntei diretamente a ele, que tomou um ar distante e disse lentamente:<br />
- "Báh! Filha, aqueles foram tempos difíceis, de batalhas e escaramuças... muito sangue correu, mas estabelecemos nosso reino de cidadãos felizes."</div>
<div style="margin: 6px 0px;">
E piscando-me um olho sorriu para mim, aquele sorriso maravilhoso... <br />
<br />
(Alma<span class="Apple-converted-space"> Welt)</span></div>
</div>
Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-30201708550711636092014-12-25T06:40:00.003-08:002014-12-25T06:40:52.134-08:00De morrer de rir (crônica de Alma Welt)<span style="-webkit-text-stroke-width: 0px; background-color: white; color: #141823; display: inline !important; float: none; font-size-adjust: none; font-stretch: normal; font: 14px/19.31px Helvetica, Arial, "lucida grande", tahoma, verdana, arial, sans-serif; letter-spacing: normal; text-align: left; text-indent: 0px; text-transform: none; white-space: normal; word-spacing: 0px;">"Quando eu era guria, correu a notícia na nossa estância, que um peão nosso de meia idade, morrera de infarto de tanto rir de alguma coisa numa roda de charla e chimarrão. Perguntei a meu pai se aquele fora um homem feliz. Meu pai respondeu: "Provavelmente não, Alma. É preciso muito desespero para se morrer de rir... " (Alma Welt)</span>Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-28412563166579460632014-12-25T05:54:00.001-08:002014-12-25T05:55:09.937-08:00O Livro do Segredo (crônica de Alma Welt)<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; background-color: white; color: #141823; display: block; font-size-adjust: none; font-stretch: normal; font: 14px/19.31px Helvetica, Arial, "lucida grande", tahoma, verdana, arial, sans-serif; letter-spacing: normal; margin: 0px 0px 6px; text-align: left; text-indent: 0px; text-transform: none; white-space: normal; word-spacing: 0px;">
</div>
<div style="-webkit-text-stroke-width: 0px; background-color: white; color: #141823; display: block; font-size-adjust: none; font-stretch: normal; font: 14px/19.31px Helvetica, Arial, "lucida grande", tahoma, verdana, arial, sans-serif; letter-spacing: normal; margin: 6px 0px; text-align: left; text-indent: 0px; text-transform: none; white-space: normal; word-spacing: 0px;">
"Quando criança, admirada com a quantidade de livros na biblioteca de meu pai, perguntei a ele se os tinha lido, todos. Ele sorriu e disse que sim. Então perguntei: Você gosta assim, tanto, de estórias? Ele riu e disse:" Alma, eu leio para ver se descubro nalgum livro, num linha que seja, a solução de um mistério: o significado da Vida". Eu insisti: "Então você ainda não descobriu? Eu vou descobrir! Por onde devo começar?" Ele parou um<span class="text_exposed_show" style="display: inline;"><span class="Apple-converted-space"> </span>pouco, começou a retirar a "Bíblia Sagrada" da estante, mas voltou a recolocá-la no lugar. Então puxou "Alice no País das Maravilhas" e me deu, dizendo: "Este livro não contém soluções, como todos, somente enigmas. Mas é um bom começo. Quando você for um pouco mais velha, te darei para ler um livro que chegou muito perto da solução, este aqui... e mostrou a capa do "Os Irmãos Karamazov". Não dei mais sossego a ele, até poder ler aquele livro." </span></div>
Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3930944707843935012.post-64640924496354252892014-03-20T08:26:00.001-07:002014-12-25T05:57:08.857-08:00De Herodes a Pilatos (crônica de Alma Welt) <div class="text_exposed_root text_exposed" id="id_532b049d916912194160177">
<span class="userContent" data-ft="{"tn":"K"}">"Um dos episódios mais curiosos do Evangelho, é que o Poncius Pilatos, representando a "justiça romana" não viu perigo nenhum em Jesus e tentou descartar-se de julgá-lo, enviando-o a Herodes, que o mandou de volta a Pilatos. Então diante da pressão dos sacerdotes do Templo, Pilatos ainda acolheu a idéia de fazer o povo escolher entre Barrabás e Cristo. Tendo o povo escolhido Barrabás, um ladrão <span class="text_exposed_hide">...</span><span class="text_exposed_show">(o povo sempre escolhe ladrões), lavou a mão do sangue daquele "justo". Fica claro que os romanos não viam perigo num homem que dizia sobre os impostos: "Dai a Cesar o que é de Cesar (e a Deus o que é de Deus)". Cristo não era político. Era superior demais para deter-se sobre a questão política, sempre sórdida afinal..." (Alma Welt)</span></span></div>
Lúcia Welthttp://www.blogger.com/profile/07605250870392022092noreply@blogger.com0